Proposta para que recordes anteriores a 2005 sejam anulados cria grande
polêmica
Depois de acusações
e revelações de doping contra atletas de todo mundo, uma ideia revolucionária
está causando polêmicas no esporte. A Federação Europeia de Atletismo propôs a
anulação de recordes anteriores a 2005, quando os testes
antidoping não contavam com a tecnologia que têm hoje. O objetivo é aumentar a
credibilidade dos recordistas e das próprias entidades. A Associação
Internacional de Federações de Atletismo – IAAF aceitou — e até apoiou— a
proposta.
Os recordes atuais,
estabelecidos fora dos padrões propostos pela organização, serão mantidos na
lista de melhores marcas da história, mas não terão reconhecimento de recorde.
O projeto propõe que só sejam válidas as
performances feitas em eventos aprovados pelas instituições. As competições
devem ter altos padrões de arbitragem e equipamento técnico com garantia. Os
atletas devem também ser submetidos a exames antidoping nos meses anteriores à
performance. Além disso, a amostra de controle antidoping deve ser guardada e
disponibilizada para novos testes pelos 10 anos seguintes.
A proposta também recomenta que o recorde seja
retirado caso o atleta utilize substâncias químicas a fim de alterar seu
desempenho, mesmo que estas não tenham impacto em sua melhor performance.
“Recordes que mostram os limites das capacidades
humanas são uma das forças do nosso esporte, mas são sem sentido se as pessoas
não acreditam realmente neles”, declarou o presidente do Conselho Atlético
Europeu, Svein Arne Hansen. “O que estamos propondo é revolucionário, não apenas
porque a maioria dos recordes mundiais e europeus terão que ser substituídas,
mas porque queremos mudar o conceito de recorde e elevar os padrões para
reconhecimento a um ponto em que todos possam confiar que tudo foi justo e
acima de questionamentos”, acrescentou.
A ideia será encaminhada à IAAF, com a
recomendação que as duas organizações coordenem a implementação de uma nova
lista de recordes.
Sebastian Coe, presidente da IAAF, disse gostar da
proposta. “Gosto porque sublinha que nós (entidades) adotamos sistemas de
controle antidoping e tecnologias que são mais robustas e seguras do que 15 ou
mesmo 10 anos atrás”, afirmou Coe. “Haverá atletas, atuais recordistas
mundiais, que sentirão que a história que estamos recalibrando estará tirando
algo deles, mas acho que é um passo na direção certa. E se for organizada e
estruturada propriamente teremos uma boa chance de ganhar de volta a
credibilidade nesta área”, disse.
Apesar de uma
decisão definitiva só deverá ser tomada em agosto, numa reunião do conselho da
IAAF, alguns atletas já vieram criticar esta intenção. Paula
Radcliffe, corredora britânica e recordista mundial da
maratona feminina, se sentiu injustiçada com a possibilidade de seu melhor
tempo ser anulado. “Eu trabalhei muito para ter este resultado e ele sempre
será válido para mim. Eu sei que consegui ele com trabalho duro, muito esforço
e dentro de todas as regras, por isso, tenho muito orgulho”, escreveu ela em
suas redes sociais. “As entidades têm a função de proteger atletas limpos, e
eles estão falhando contra isso”, acrescentou a atleta que correu uma maratona
em 2h15s25min.
Radcliffe também não acredita que esta seja a hora
certa. “Embora estamos avançando, eu não acredito que chegamos no ponto em que
temos um procedimento e um teste capazes de pegar todas as fraudes, então, por
que começar do zero agora? ”, defendeu a atleta. “Nós realmente
acreditamos que um recorde feito em 2015 é totalmente limpo e um em 1995 não?”
A decisão da entidade, no entanto, foi fortemente
reprovada por Paula e outros quem detém recordes e que garantem não terem sido
alcançados devido a influência de substâncias ilícitas no corpo.
É o caso de Mike
Powell, dono de recorde do salto em distância que poderá
ser retirado.
Para Powell, que
irá brigar judicialmente para manter sua marca, a tentativa da Iaaf de
consertar recordes manchados por interferência de doping não pode reescrever a
história de marcas conseguidos com esforço e dedicação, o que avisa ser o seu
caso.
“Já contatei meu advogado. Existem recordes por aí
que são de fato questionáveis, posso perceber isso, mas o meu é genuíno. É uma
história de coração humano e coragem, um dos maiores momentos da história do
esporte. Eles estariam destruindo muitas coisas com essa decisão, sem nem mesmo
pensar nela. É errado. Independente do que acontecer, eu irei lutar”, disse o
atleta.
Powell é dono do melhor desempenho da história no
salto em distância, graças a marca de 8 metros e 94 centímetros alcançados em
agosto de 1991 e jamais igualada ou ultrapassada desde então.
Incomodada com as reações negativas vindas de todos
os lados, o grupo de trabalho autor da proposta veio esclarecer, através do seu
presidente Pierce O”Callaghan, que atletas como Paula Radcliffe, Jonathan Edwards
e Colin Jackson “são danos colaterais” desta medida. “Pedimos desculpas a estes
atletas, nunca quisemos denegrir a suas reputações, mas foi entendido que é
preciso dar credibilidade ao desporto”, frisou.